OPINIÃO - A laicização da igreja, os equívocos, a ingratidão e a competição
por ARNALDO JUSTINO DA SILVA - Cresci na igreja e a frequentei regularmente com meus pais durante meus primeiros anos até aos 7.
Depois mudei de cidade, fui morar em um lugar maior, em vez de mil, tinha uns quinze mil habitantes.
Meus genitores conheciam pouca gente e nós íamos muito pouco à missa. Raramente.
Ficava com saudade de colocar os ramos na orelha em Domingos de Ramos, coisa que minha irmã mais velha me ensinava a fazer aos três anos de idade.
O pouco de gente boa que reside em mim, veio dos ensinamentos religiosos que recebi: não fazer mal ao próximo, dar a outra face, ser solidário com as pessoas.
Anos depois, passei a lecionar na faculdade de Direito. Lembro-me que um dia falava sobre as diferenças das regras de direito e de religião, quando uma aluna levantou a mão com o dedo indicador para cima e depois de um aceno meu autorizando, disparou a seguinte pergunta:
- Professor, o senhor é a favor da religião?
Olhei para todos os demais, que atenciosa e ansiosamente esperavam a resposta, qual não foi a surpresa deles quando respondi, contrariando a fala do politicamente correto dos dias atuais:
- Claro que sou. É muito melhor a pessoa estar dentro da igreja aprendendo a respeitar o próximo; conscientizando-se de que é pecado roubar, matar. Prefiro as pessoas na igreja do que nas portas dos botecos, bebendo, matando, morrendo. Na igreja aprende-se a ser solidário, a amar o próximo, não se aprende a fazer mal aos outros.
Nem acabei de responder e veio outra:
- E a laicização do Estado professor?
Pronto! Essa é uma boa pergunta.
Estado laico hoje é visto por muitos mal informados ou mal intencionados de que a Igreja é inimiga do Estado; que a autoridade não pode ter em seu gabinete algo que lembre ou demonstre a sua fé.
Há ações judiciais propostas pedindo a proibição disso ou daquilo sob o escudo da laicização.
Nosso Estado é laico, mas isso não impediu que o constituinte demonstrasse sua religiosidade no preâmbulo da Constituição quando ali inseriu :
“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL”
Estado laico não significa que o Estado é inimigo da Igreja; fosse assim, a Constituição seria inconstitucional, em comparação com a vontade popular desde agora e sempre; quer dizer apenas que a fonte do poder das normas que regulam a organização do Estado e a conduta das pessoas não proveem da autoridade religiosa, mas das autoridades eleitas no regime democrático ou das autoridades que tomaram o poder, na ditadura.
É isso! Nada mais. Não proíbe o político ou qualquer autoridade que professe ou demonstre sua fé.
O Estado não é governado pelas autoridades religiosas e nem estas pretendem ser fonte de poder de organização do Estado ou de normas de conduta coercitivas.
Contudo, muitas autoridades olham e não veem ou veem, mas não têm a honestidade para admitir: as igrejas (a religiosidade) tem ajudado muito mais na convivência harmônica entre os membros da coletividade do que as próprias normas coercitivas.
A propósito, a reincidência é uma prova disso.
É muito melhor as pessoas respeitarem as normas de convivência por estarem convencidas de que isso é necessário para a harmonia social, do que respeitarem as normas de convivência harmônica simplesmente por medo de punição.
As pessoas das igrejas respeitam as normas de convivência por fé nos ensinamentos de exemplos de amor ao próximo, e não por medo de prisão.
Já os outros, os que não creem em nada, respeitam as leis por receio de sanção, e não por sentimento solidário, ético ou de amor.
Por isso, vejo como por demais equivocada ou muita ingratidão com a contribuição da religião, algumas ações judiciais contra símbolos religiosos.
Quem sabe essas ações não sejam obra de equívocos ou ingratidão, mas atitudes de ateus travestidos de representantes de autoridade estatal.
Outras vezes penso que tem autoridade que quer mandar mais que o padre ou o pastor, e quer competir com eles.
Mas, o padre não manda nada. O padre e o pastor só ensinam e tentam ajudar as pessoas a serem solidários e ajudar o próximo.
Arnaldo Justino da Silva é Promotor de Justiça em Mato Grosso.